Perspectivas e Cenários para Digitalização de Negócios Agro (3)

"Perspectivas e Cenários para Digitalização de Negócios Agro (3)" foi o título abordado por Matheus Consôli essa semana, dando sequência ao artigo interior.

A questão das potenciais mudanças, desafios e oportunidades da digitalização de negócios no agro, por meio de vendas online e canais ominichannel tem sido o foco dessa sequencia de artigos. Nos artigos anteriores, após algumas reflexões, estávamos abordando a questão inicialmente conceitual e entendimento do “potencial de digitalização”, seja para atrair empresas de fora do setor, seja para movimentar empresas tradicionais na sua transformação digital. Já falamos no artigo anterior da (1) sensibilidade a preços dos clientes no mercado em questão, e nesse artigo vamos avançar na questão da (2) atratividade do mercado em si e a (3) natureza e características dos produtos.

A começar pela (2) atratividade dos mercados, não é de se estranhar que a maioria dos negócios digitais estão atualmente concentradas nos negócios de alto valor e crescimento acelerado, onde canais digitais não só reduzem os custos de transação, mas também melhoraram a experiencia de compras. Além disso, onde a competição se dá por ofertantes e clientes mais pulverizados (baixa concentração) e há baixa necessidade de sofisticação para efetivar negócios, a realidade dos negócios digitais é mais presente. É só fazer uma visita ou experimentar uma compra na Amazon, Mercado Livre, Magalu, entre outras e facilmente se verificará a infinidade de opções para negócios B2B ou B2C oferecidas por essas plataformas.

Assim, ao olharmos por esse prisma, os negócios no agro, em geral, podem parecer menos atrativos para digitalização. Primeiro pois em alguns negócios de insumos há uma certa concentração de empresas ofertantes, assim como temos discutido que a distribuição também se consolida fortemente no Brasil e em vários outros países relevantes no agro. Segundo, a complexidade creditícia ainda pode ser um entrave para aceleração dos negócios de algumas categorias de produtos, dado que por ser um mercado B2B (na verdade costumamos chamar de B2F  - business to farmers, pois mescla características B2B com algumas B2C) o ticket médio é alto e são transações de valor elevado, tipicamente pagas a prazo ou financiadas.

Por outro lado, se olharmos para o lado da demanda, temos milhares de agricultores e pecuaristas, de diferentes portes, perfis e características, que nem sempre tem facilidade e experiências atrativas nos mercados tradicionais. Nesse sentido, para empresas com dificuldade de acessar mercados ou se relacionar com canais existentes, ou mesmo para fornecedores e distribuidores aumentarem a eficiência de vendas de clientes de pequeno porte (que geralmente tem um custo se servir x compras relativamente alto) ou clientes corporativos (que tendem a ter negócios mais transacionais em alguns segmentos de produtos), a atratividade dos negócios no agro podem ser sim significativas.

Por fim, quando à (3) natureza e características dos produtos, em geral os negócios realizados por meio digital avançam primeiro com aquelas categorias de produtos que sejam fáceis de armazenar e transportar, que sejam de alta margem (algumas plataformas cobram de 2-15% de taxa nas transações que realizam), e que demandem pouco ou nenhum suporte pós vendas e que primordialmente não demandem elevada capacidade técnica dos clientes ou usuários. Novamente, uma primeira visão pode ser que no agro tudo é mais difícil. Produtos em grande volume, caros, de margem relativamente baixa e que demandam suporte técnico.

Aqui naturalmente cabe um cuidado, mas nem todas essas restrições são intransponíveis e nem todas categorias de produtos se encaixam nesses critérios. Por exemplo, fertilizantes e alguns produtos de proteção de cultivos são de fato volumosos e de baixa margem. Porém, já existe uma predisposição de clientes a comprá-los por meios diferentes, pois tem pouca demanda técnica e empresas especializadas de transporte e operação logística podem realizar seu escoamento de modo eficiente. Ademais, em muitas opções de marketplaces, o produtor retira ou pode receber o produto de um distribuidor local, conectado a uma plataforma digital. Outros segmentos, como Peças e MROs são padronizados, já possuem redes de distribuidores, tem valores de transação relativamente baixos, podem ser entregues por transportadores, “courries” ou mesmo Correios.

Assim, para finalizar a discussão com esses temas e entendermos se existe algum potencial nesse mercado, para fins de ilustração, só o mercado de insumos agrícolas (Fertilizantes, Sementes, Defensivos, e especialidades) é estimado pela Markestrat em cerca de USD 36 bilhões em 2025. Se adicionarmos mais os produtos veterinários e nutrição, peças e MRO, implementos e máquinas de pequeno porte e outros produtos, facilmente teremos um mercado potencial maior que USD 50 bilhões, ou algo próximo a R$ 250 bilhões. Se 10-15% desse mercado for digitalizável, para 2025, algo próximo a R$ 30 bilhões poderá estar sendo transacionado em plataformas digitais de e-commerce ou marketplaces corporativos ou de mercado, isso sem considerar receitas de serviços. Pense nisso e bom trabalho!